sexta-feira, novembro 24, 2006

Ilha da Magia

Moro na lagoa da Conceição.

Lugar bonito, mil belezas por metro quadrado. A cada passo dado uma promessa de Afrodite, um olhar de Cupido.

Nesse sábado ensolarado pedalei, como sempre, o circuito Centrinho, Morro da Lagoa, Mole, Joaca, Barra, indo e voltando, apreciando a paisagem, conversando com os já conhecidos, alguns até íntimos amigos, moradores antigos do lugar.

Respiro fundo e fecho os olhos enquanto deitado na praia sinto o sol forte queimar meu rosto e o vento sussurrar encantos.

Surfistas ao longe, homens e mulheres, pontilhando de negro o mar revolto, verde-esmeralda, um misto de downhill, cavalgada e sexo.

Vontade de tudo isso, de uma só vez, em um momento eterno.

Ao meu redor, dezenas de corpos reluzem dourados, um pouco do sol, do céu, na terra.

Hora de partir. Sou um errante na ilha. Procuro meu lugar aqui mas estranhamente, durante a busca, sinto cada vez mais intensamente que eu sou a ilha e que a ilha sou eu.

Todo lugar que vou é o lugar que devo estar.

A noite se aproxima, os parapentes ao longe parecem flutuar, imóveis no ar. Um grande círculo avermelhado, imponente, mergulha por detrás dosmorros já escurecendo o Canto dos Araçás.

Desço o morro da Mole em direção às Rendeiras. Descida forte. 66Km, 75Km, 77Km....subida...50, 40, 32...descida....60. Coração bombando nas veias, pulmões queimando, adrenalina. Na minha cabeça é como se fosse uma fuga do paraíso. Correr, muito, muito, pois a vontade de ficar é grande, quase física.

Posso quase ouvir alguém me chamando de volta.

Nas Rendeiras, uma linha de 2Km de carros se arrasta na minha frente.

Procissão silenciosa testemunhada pela placidez da Lagoa da Conceição ao lado.

Barquinhos sonolentos ao largo. Pessoas correndo na calçada. Um cachorrinho tentando atravessar. Gaivotas sobrevoando, magníficas em seu ambiente natural.

Pedalo o mais forte possível. Aumento o som no meu headphone. Angie, dosRolling Stones. Senti vontade de chorar enquanto rumava para o Centrinho.

Saudades dos meus parceiros de pedal, das minhas amigas de coração. O Paraíso só é completo quando partilhado com aqueles que se gosta.

Eu escrevo para partilhar o momento enquanto espero um reencontro e a comunhão da magia com a amizade e o amor.

Parei no Café da Lagoa, Eron, Marcos, Kellly e Mari, já são velhos conhecidos.

Cumprimentos, um suco de manga bom demais. Abraço Mari e confirmo a segunda pro sand-board. Mari mora na Joaca e vai me ensinar a descer as dunas e chamar o resgate se precisar
:-D .

Galera desce a mais de 70Km as dunas. Eu vou cair antes, é claro.

Paro na academia. Acordei pilhado hoje. Já estou a 30 horas sem dormir, mas preciso de um pouco mais de esforço. Purificação, redenção, penitência, não sei.

Cali e Patrícia sorridentes me recebem. Vanessa, ao longe, acena. Faço uma das horas de academia mais cansativas da minha vida. Carregar o peso do mundo. Algo assim.

Vou pra casa cansado, muito cansado. Banho.

Jantar com os amigos em outro lugar de gente boa, o Del Tomati. Comida excelente. Qualquer coisa, massas, carnes. Ultimamente eu prefiro as sopas. Não consigo comer a quantidade toda que vem nos pratos.

Ângela, uma menina ex-aeromoça da Varig não está mais lá. Que pena. Conversávamos o tempo todo. Simpática, culta e linda. Inglês perfeito. Adora cinema e poesia. Maravilhosa.

Sempre um sorriso no rosto. Um jeito de andar cativante. Quando parada, olhando nos olhos e sorrindo enquanto falava era quase hipnótico. Muitas vezes fiquei sem saber o que ela dizia fascinado que estava com aquele rosto.

Jantar com os amigos, especialmente amigos bem humorados e de coração imenso foi especial. Um dia inesquecível.

Às 23hs eu e um brother, carioca em tudo aquilo que os cariocas tem de melhor, atravessamos a rua para ouvir uma galera que manda muito no som.

Nessa noite, no barzinho Primeiro Tempo, uma garota contralto, não sei o nome, mas velha conhecida, ladeada por um baixista de primeira linha fez a festa pra nós. De longe éramos os mais animados do lugar. A afinação de nossas vozes era parecida com a de um sapo sendo pisado, mas as letras estavam todas no sangue.

E o que importava era o sentimento. Isso nós temos bastante.

Outro dia talvez eu conte alguma coisa dessa noite, outro dia.

Antes de irmos os músicos perguntaram nossos nomes e nos dedicaram uma música, a menina mandou Cazuza, "exagerado, jogado as seus pés...", a voz dela é de arrepiar. O clima se tornou romântico, outras músicas vieram.

Quem sabe se não volto lá novamente e ouça um pouco mais de perto o som daquela voz?

Mas ao final daquele dia regado a muito pedal, praia, sol, vinho, amor e boa companhia, eu precisava chegar em casa rapidinho, estava apagando, tremulando como um lampião em meio a um vendaval.

Dormir.

Foi Bom demais.

Abraços,

Ricardo "Curupas"

quinta-feira, agosto 10, 2006

Feliz Aniversário Amiga!

Todos nós temos sonhos, não é minha querida?

Alguns deles são difíceis, como viajar até a lua ou fazer uma expedição a pé até o Tibet. Engraçados, como tomar banho pelado em uma ilha deserta, ou passar meses em Amsterdam.

Outros são pura maluquice, como saltar de paraquedas ou estudar astrofísica.

E existem os sonhos inesperados. Aqueles que não se encaixam em lugar algum e que você evita até admitir que os tem.

Quando se realizam mudam a tua vida.

Eu sonhei conhecer alguém como você algum dia.

E tendo conseguido isso, meus antigos sonhos perderam a importância.

Novos vieram.

Adoro você.

Feliz aniversário.

terça-feira, julho 25, 2006

Para uma pessoa muito querida, de muitos anos atrás

Eu lembro de você naqueles primeiros dias, tanto tempo atrás que eu nem quero falar em datas. Saia blue-jeans, um chinelinho bege de amarrar, o cabelo preso e uma pequena blusa branca.

Naquela época você era bem branquinha, o sol de muitos passeios na floresta ainda não havia tocado em você, te emprestando além da luz, a cor.

Você passava agarradinha em seus livros e parecia tímida, quase encabulada quando passava.

Não sei se tu notavas, mas alguns olhos sempre te seguiam...onde quer que tu fosses.

Mas esses olhos que te seguiam podiam pouco mais que isso, prisioneiros que eram de um desencontro, daqueles que a vida sempre nos reserva, em cada esquina, a cada segundo. As vezes cruel, as vezes piedosamente.

E os anos passaram, a presença se tornou ausência e a lembrança se tornou saudade.

Às vezes, como naquelas imagens de filme, eu sonhava você acordado, não de todo certo de minhas lembranças.

Nesses sonhos/lembranças eu via teus grandes olhos cor de mel e teus cabelos soltos, do jeito que eu sempre te pedia pra fazer.

Sem os livros, descalça, os pequenos pés marcando o chão úmido daquele riozinho da universidade.

Você sorria suas covinhas e não dizias nada enquanto meu coração seguia cada movimento teu, impotente diante da visão.

Eram dias diferentes para mim quando isso acontecia.

Algumas pessoas a gente sente não o que vê, nem o que foi ou o que vai se tornar, sente a essência e o todo. Todos os momentos simultaneamente. Explosão.

Quando eu ficava ao teu lado, ou quando te via passar, você transformava o lugar. Não importava onde fosse ou como fosse. O lugar se enchia de uma energia especial.

Pelo menos pra mim.

Muito já disseram a teu respeito, Renatinha. Tudo eu concordo e reforço, mas faço um resumo, se é que é possível resumir com palavras alguém como você.

Você é uma pessoa mágica.

E é, foi e será muito bom estar perto de você.

Queria ser um pássaro agora.

Saudades.

segunda-feira, junho 19, 2006

Terra Ronca - Pedal Bruto!

As coisas no papel, mesmo as mais cuidadosas e as mais detalhadas, parecem mais fáceis e simples de se realizar do que na vida real. Porém, quando você passa da idéia para a ação, você percebe que a realidade é bem mais pesada, sempre. E muito mais bonita e gratificante.

A viagem para Terra Ronca, foi fantástica, inesquecível, brutal e cheia de adoráveis surpresas ao longo do caminho. A idéia era ficar apenas dois dias por lá pedalando e partir em direção a Cavalcante via Nova Roma, pedalando sem apoio, tudo nos alforjes, mas tivemos que nos readequar aos problemas ocorridos em cada dia e modificar o planejamento para os dias subsequentes.

Nos próximos dias eu contarei essa história pra vocês em detalhes. Mesmo tendo modificado nosso percurso inicial o resultado não foi menos satisfatório. Pelo contrário, melhoramos em muito a percepção de nós mesmos, de nossas bikes e do mundo fantástico que nos cerca, quase nosso quintal. Cada momento passado nos engrandeceu como pessoa e nos preparou para desafios maiores, não temos do que nos queixar, foi bom demais. Posted by Picasa

terça-feira, maio 30, 2006

GP de Montanha 2006: Vou ficar no apoio dessa vez

Pois é galera do pedal, pausa no sofrimento.

De vez em quando até o mais maluco e mais descontrolado fominha por pedal tem que se mancar e por as sapatilhas de molho, não é? Ainda estou me recuperando da distensão sofrida no Audax 300Km e no feriadão do dia 15/06 eu quero estar pronto para encarar a ida para Terra Ronca e de lá partir para Cavalcante para dar a volta na Chapada dos Veadeiros, via Colinas do Sul.

Mas, para não deixar passar em branco o GP de Montanha, vão alguns comentários: o Weimar continua ensandecido na sua mania de torturar o pessoal do mountain-bike. Na prova anterior teve aquele carrega-bike inesquecível seguido daquele tobogã maluco. Na prova desse ano ele está mais maquiavélico, colocou um descidão na largada, que é claro vai gerar uma grande quantidade de tombos porque a galera vai se desesperar para ser a primeira no single-track.

E a coisa é mais maléfica ainda porque vira uma subida nojenta no final da prova, que se tornou um longo circuito.

Altimetria - Esporte


O "sprint" de chegada vai ser bonito de ver. Após a subida toda do Delírio e alguns maus bocados entre outras subidas assassinas de pulmões e pernas, eu acho que não vai ter muito biker chegando forte.

Ahhh!! E a gracinha da prova light?

Weimar, procura um médico, que é que tem de light nessa prova? Ainda bem que eu tenho a minha desculpa da distensão, vou poder ficar de fora tirando onda.

Altimetria - Aventura

Cuidem-se todos, boa sorte, boa prova. Treinem bastante, não esqueçam da água e de comer bastante macarrãozinho antes da prova, e rezem bastante pro seu anjo da guarda.

Vão precisar.

Audax 300Km - Não foi desta vez...


Algumas histórias são fáceis de se contar, olhando para trás, pode-se ver com clareza onde tais histórias começam, contá-las acontece muito naturalmente, histórias de pescadores são assim, grandes feitos heróicos também e por aí vai, mas existem aqueles acontecimentos tão cheios de emoções, tão carregados de conteúdo que não se sabe ao certo onde começaram,alguns namoros são assim...algumas dívidas também.


O Audax para mim é como um namoro, não sei como passei a me interessar por ele, se eu o descobri ou o contrário, não importa.

Acho que o Audax começou pra mim naquela dia em Santa Bárabara de Goiás, dezenove de dezembro de 2004. O dia em que eu vi um bando de malucos sobre suas bikes. E como boas coisas não acontecem sozinhas, foi nesse dia que eu também descobri o número enorme de prazeres que uma bike pode proporcionar.

Conheci o pedal descompromissado do rebas e do pedal noturno, o pedal maluco e kamikaze de alguns colegas, o estilo e a força de camaradas da elite. Conheci os tombos em descidas, as caimbras das subidas, o esforço psicológico das longas distâncias, a solidão nas trilhas e a boa companhia e o bom papo nessas mesmas trilhas. Pedalei em Minas Gerais, Goiás, Natal, Fortaleza e Rio Grande do Sul, e, se você esquecer o sotaque variado, descobrirá que os ciclitas são todos iguais onde quer que você vá.

Tá aí uma coisa que torna de fato os homens irmãos: o esporte, em particular o esporte sobre uma bike. O Audax 300Km foi mais uma oportunidade de comprovar que eu sou pirado mesmo por esse negócio de bike. Foi mesmo de me apertar o coração não ter cruzado aquela linha de chegada. Vou aparecer por lá no 400Km pra prestigiar.

Chegamos em Porto Alegre as 9.30 do dia 19 após uma escala rápida em São Paulo/Guarulhos. Eu, Walter, Foca e PC. Optei mais uma vez pela speed ao invés da mountain bike mesmo sabendo da previsão de chuva para a madrugada da largada. Do chão a gente não passa. Meus camaradas despacharam suas bikes montadas, apenas com os componentes mais delicados: câmbios, suspensão, etc. protegidos por espuma. Parece ser uma forma mais segura de transporte em aviões excetuando-se talvez o transporte em case rígido.

Minha bike não veio, foi descarregada erroneamente em São Paulo, parece que alguém confundiu o mala-bike com instrumentos musicais da banda Areketo que desembarcou em São Paulo. O mala-bike só chegou as 16.50 com alguns sinais de maus-tratos pelo pessoal da TAM. Embora aviação seja uma atividade de alta tecnologia essa alta tecnologia não chegou as bagagens nem aos lanches fornecidos.

Comecei a montar minha bike por volta das 18 horas, o resto do pessoal já estava trabalhando nas "vestimentas" para uso durante o pedal pois desde que descemos no aeroporto até o término da prova uma chuvinha fina e insistente, de dia em torno de 16 graus e a noite entre 9 e 10 graus, caia constantemente sobre os ciclistas. De quebra um vento razoavelmente intenso deveria colocar a sensação térmica em torno de 6 a 7 graus a noite. Eita! Nós do deserto iríamos sofrer um pouco.

Na minha bike eu instalei um bagageiro e sobre ele pus uma bolsa apropriada carregando cerca de 3.5Kg de hidro-plus, power-gel e material de primeiros socorros além de ferramentas e câmaras de reserva. Não gostei do uso de mochilas de guidão na speed, prejudica muito a manobrabilidade. Usei duas garrafinhas de água, mais do que suficientes para chegar em cada PC separados entre si por 50Km cada um. Em uma garrafa hidro-plus e na outra somente água. Poderia ter levado a metade de tudo,incluindo da água.

Não sou muito friorento e também não gosto de usar muitas roupas, usei meu breteli amarelo, camisa de manga curta, um quebra-vento sem manga, um casaco de suplex de manga comprida por cima, uma capa de chuva e o refletivo por cima. Calcei um par de luvas de lã, protegi essas luvas com luvas cirúrgicas (de látex) e pus a luva de ciclismo sobre. Fiquei na dúvida sobre a efetividade da solução. Acho que bastariam as luvas de ciclismo. Não senti frio em momento algum durante o pedal, incluindo durante a largada. Sentia algum desconforto após cada saída de um PC porque estava molhado e o corpo começando a esfriar. A recomendação para não deixar o corpo esfriar é cem por cento correta!! Se você optar por parar por muito tempo em algum lugar que não seja com a roupa molhada.

Após a largada eu optei por pedalar em velocidade bem baixa para poder sentir a bike naquela chuva toda. Existia uma certa dificuldade de se enxergar o asfalto, em parte por conta da chuva e escuridão, e em parte por conta das luzes traseiras de algumas bikes que me ofuscavam. Catei alguns buracos nesse momento e tive que fazer manobras de última hora algumas vezes mas aos poucos me acostumei com o terreno e posso dizer sem sombra de dúvida que não é tão fácil como se pensa por uma speed no chão, a fragilidade da roda para mim foi a única preocupação. Catei alguns buracos que eu pensei haviam tornado a roda quadrada, mas a magrela resistiu bravamente.

Após a ponte sobre o rio Guaíba eu colei em um "bolo", um bolo é uma coisa parecida com um pelotão. Era composto basicamente por mountain bikes, fiquei por ali aproveitando a proteção contra o vento e tentando localizar meus camaradas dos quais havia me perdido, havíamos combinado pedalarmos juntos.

Não gosto de ficar em pelotes de mountain bike quando estou de speed porque os brothers pilotam de forma diferenciada, atropelando buracos e confiando na efetividade de seus freios e tração. Fui pulando de pelote em pelote até encontrar Walter nos esperando no quilômetro 15, aguardamos uns pouco segundos e PC e Foca se reagruparam, continuamos o pedal e mais uma vez nos separamos. Me aproximei de um pelote de cinco mtbs e fiquei por ali enquanto aguardava a galera se aproximar.

Passada uma meia hora PC se aproximou carregando a iluminação menos discreta da história do Audax, parecia a iluminação daquelas "casa de tolerância" em bairro de periferia, impossível pedalar atrás dele sem comprometer a visão e a sanidade. Por volta do quilometro 30, próximo a um pedágio, eu e PC resolvemos aguardar Walter e Foca, fiz um pipi profilático (aquele que vc faz porque não tem nada melhor pra fazer) e comemos algumas bobagens. A espera foi demorada e pensamos que talvez Walter e Foca houvessem nos ultrapassado sem que houvessemos percebido. Subi na bike pedalei um pouco ao lado do PC e logo nos separamos mais uma vez, nosso próximo encontro seria no PC 50Km.

Olhando para trás observando a iluminação frontal da bike do PC me veio a cabeça "Contatos Imediatos" e "Independence Day"...brrr! Com aquela balaclava e um certo olhar insano talvez PC não fosse, afinal, um terráqueo. A pista nos últimos 20Km em direção ao PC 50Km era sem iluminação e eu aproveitava o farol dos carros que passavam para avaliar o trecho que seria pedalado, mais de uma vez pedalando no acostamento eu escapei de me machucar por conta do estado em que se encontrava. Resolvi pedalar na pista, ao lado esquerdo do acostamento, muitos outros bikers já estavam fazendo o mesmo. Fui novamente pulando de pelote em pelote. Parava alguns minutos atrás de um pelote, escolhia o próximo mais para a frente e assim ia avançando o trecho. Era uma forma de distração. Faltando cerca de 5Km encontrei dois caras de speed socando abota naquele escuro. Colei neles e fomos a quase 32Km por hora sem enxergar direito o caminho. Sei, 32Km não é muito de speed, mas no escuro era sim senhor :o). Eles de vez em quando tentavam uma fuga mas eu consegui me manter colado, eita coisa boa! Ao atravessar uma ponte o desnível quase me derruba, logo em seguida, a chegada ao PC 50Km pois fim a nossa afobação, ainda bem. Estavamos que em meio a um pega. Não ia acabar bem :o).

Carimbei meu passaporte e corri para pegar um pedaço de pão e café, o pão estava dentro de um saco e eu não conseguia enfiar a pata com a luva lá dentro. O brother do apoio me ajudou. Não tirei as luvas por que a mão de obra pra por o conjuntinho fashion-cirúrgico seria grande. Nesse instante chegaram Walter, PC e Foca. Ficamos um bom tempo por lá, uns 20 minutos eu acho, mais do que eu gostaria. Por fim saímos em direção ao PC 100, estavamos em um ritmo bom, se o mantivessemos, o brevet 300Km estaria no papo.

Seis quilômetros mais para a frente Walter avisa que vai parar e voltar para o PC 50Km, disse que não estava se sentindo bem. Ficamos preocupados com a volta solitária de Walter e insistimos para ele continuar até o PC 100, mas vocês conhecem nosso amigo, não é? Nem parou para conversar, fez meia-volta e foi embora. Depois eu pensei que a distância era pequena e que uma grande quantidade de bikers ainda estava atrás de nós. Walter não ficaria sozinho durante o retorno, mas era uma pena.

Uma sombra de pesar passou pela minha cabeça. O planejamento, a animação, as discussões, as dificuldades e as decisões eram todas feitas em conjunto. Quando um de nós se separa do grupo, o grupo morre um pouco...

Enquanto isso, a chuva fina continuava, a temperatura era de cerca de 9.8graus, sim, eu estava com um termometro amarrado na bike :o). O vento frio lambia o rosto, pelo menos o meu que estava sem proteção, e eu sentia pequenas agulhadas na face. Ao longo daquele trecho escuro, alguns automóveis, muito raros, passavam nos cumprimentando. Eu levantava a cabeça e podia ver quilômetros de luzes vermelhas a minha frente das bicicletas dos camaradas Audaxiosos. Muito legal! Aqui e acolá alguns ciclistas parados consertando ou ajudando a consertar magrelas, mas tudo tranquilo, todos animados. Exceto pela nossa presença não havia vivalma no lugar.

Chegamos a uma ponte sobre um grande rio. Tem um nome incomum, não lembro agora. Mais um pouco de pipi profilático. Após uma pequena subida em seguida a essa ponte, do outro lado da pista, havia uma espécie de pracinha, com bancos, um comércio mais ao longe..algo assim. PC parou e avisou que estava com sono que iria parar por ali e tirar um cochilo e que nós podíamos continuar, sem problemas. Em silêncio, eu e Foca concordamos. Recomendei PC que apagasse as luzes da bicicleta e seguimos em frente. Pensei que não fosse mais ver o PC porque acreditei que ele fosse alongar em demasiado o sono e acordar frio e desanimado demais para voltar a pedalar, especialmente sozinho.

Alguns quilômetros atrás, logo depois que deixamos Walter, Foca estava pedalando bem enquanto que PC estava mais lento. Agora, após termos nos separado de PC, Foca começou a diminuir o ritmo, faltavam pouco menos de 25Km para chegarmos ao PC 100 e era algo em torno das 4.30 da manhã. Estimei nossa chegada em um primeiro momento para as 6.30 da manhã. Não era de todo mal embora nos forçasse a uma parada rápida naquele PC. Porém aquele era um trecho de subidas, não era um trecho de subidas fortes mas de múltiplas subidas.
Foca começou a reclamar muito do frio e reduziu bastante o ritmo do pedal, para algo em torno de 8Km/h. Minha previsão de chegada passou para as 7.30.

A medida em que avançávamos lentamente através daquelas subidas, vários pelotes nos ultrapassavam, alguns deles também em baixa velocidade. Aos poucos, até os ciclistas solitários nos alcançaram e nos ultrapassaram. Certa feita paramos para verficarmos os batimentos e situação geral. Os batimentos de Foca estavam bons, assim como o meu que era cerca de 112, coerentes com o frio, o ritmo e o tempo de pedal sem dormir.

Prosseguimos e, aos poucos, após a última subida, enfim o PC 100. Foca resolveu desisitir. Me pagou um chocolate quente e, enquanto eu verificava minha água e comia um pedaço de chocolate, para minha surpresa e alegria vi o PC aparecer com a sua bicicleta estilo "Daslu". Não iria continuar o próximo trecho sozinho. Muito bom! Fiquei rindo sozinho um tempo. Imaginei que PC havia parado naquele ponto deserto para aguardar a nave mãe e passar algum tipo de relatório, ou então recarregar seu tanque de metano-hidrogenio para poder respirar na atmosfera terrestre...PC partiu alguns metros na minha frente. Em meio a primeira pequena subida após o PC 100Km eu o alcancei e assim, pedalando em um ritmo bem lento, cerca de 6Km/h, prosseguimos por mais um ou dois quilômetros. Conversamos abobrinhas e discutimos a respeito do tempo de prova restante, da nossa velocidade atual e se nesse ritmo conseguiríamos completar a prova no tempo. Na minha opinião precisávamos acelerar mais do contrário teremos que pedalar forçado muitos quilômetros. PC acreditava que houvesse tempo mas me disse que estava cansado para realizar as subidas mais rápido e disse que eu poderia partir em um ritmomelhor, sem problemas, nós conversaríamos quando eu cruzasse o caminho dele já voltando ou então no PC 150Km caso eu não sustentasse um ritmo bom. Acelerei aos poucos até que alcancei a média de 22Km/h, foi fácil porque o trecho era bem pouco acidentado. Ultrapassei vários ciclistas isolados e alguns pelotes, estava me sentindo muito bem. O fato de pedalar um pouco mais forte me aqueceu e eliminou os últimos vestígios de sono. Vinte quilômetros mais para a frente eu encontrei uma subida longa, não muito inclinada mas que eu só consegui subir a 14Km/h. A minha frente, quatro ou cinco ciclistas estavam completando a subida. Nesse momento também vi os primeiros ciclistas retornando do PC 150Km. Avaliei que eles estavam uma hora e meia a minha frente, cerca de 40Km incluindo o tempo de parada no PC 150. Não estava tão ruim assim. Após essa subida alcancei uma área relativamente plana onde pude pedalar a cerca de 32Km/h por um bom tempo, passei por alguns povoados, cruzei com alguns locais e outros ciclistas do Audax e por fim, 15 paras 10, eu alcancei o PC 150Km, dentro do prazo que havia me estipulado. Carimbei meu passaporte e voltei para rotina de verificar a água, comer chocolate, hydro-plus e então fui lanchar. Resolvi que ficaria ali até as 10.20 para aguardar PC. Não sabia que ele havia desistido 15Km depois que nos separamos.

Tive alguma dificuldade pra pedir um queijo-quente e uma média. O rapaz do balcão não sabia o que era. No final deu tudo certo.

Fiz mais um pipi. Acredito que fiz cerca de 20 pipis durante essa prova :o).

Quando eu saí da "lancheria" pra pegar a bike achei que as minhas coxas estavam muito inchadas, contraídas pelo pedal. Achei que seria uma boa idéia alongar um pouco. Me apoei em algum lugar e segurei na perna direita flexionando a mesma pra trás, não consegui flexionar muito e desisti, passei para a outra perna e puxei com um pouco mais de força. Senti um pequeno estalo próximo ao lado externo e acima da patela, como um elástico rompendo. Não senti dor alguma mas desisti de alongar.

Caminhei para o outro lado da rua, subi na bike e iniciei o pedal de volta. Estava me sentindo muito bem ainda. Olhei para o relógio, o batimento em 122, velocidade 24Km/h e acelerando, respiração boa. A temperatura estava em torno de 13 graus. 10.40 da manhã. Previsão de chegada no PC 150Km: 12.30. Tava bom. Fiquei feliz, achei que conseguiria completar o Audax 300Km. Dez quilômetros para a frente senti uma dor intensa próximo ao joelho que por muito pouco não me derruba da bike.

Doeu tanto que meus olhos se encheram de lágrimas...reduzi a velocidade do pedal para 12Km/h e imaginei alguma distensão, pedalei mais uns 5Km e a dor me pareceu diminuir. Mais ou menos nesse momento, Walter e Foca se aproximaram de carro e perguntaram como eu estava, eu avisei que meu joelho estava doendo, que talvez não fosse conseguir. Eles me ofereceram resgate mas como a dor estava sob controle eu decidi tentar chegar ao PC 200Km antes de tomar uma decisão final. Eles me desejaram boa sorte e foram embora buscar o PC, que havia pegado uma carona de caminhão até o PC 250Km. Eu ainda vi o carro terminando uma subida que eu iria começar em breve.

Era uma subida simples. Mole de fazer. Não consegui pedalar nem 100 metros a dor no joelho aumentava horrores na subida. Tive que descer e empurrar.

Um camarada do Audax se aproximou de mim, e tentou me animar a continuar, disse que eu iria terminar sim senhor, que eu chegaria ao PC 200Km faria uma massagem e continuaria, mas estava doendo muito meus camaradas, muito. Eu subia na bike nos planos e toda vez que eu começava a girar a perna esquerda doia muito, depois de um tempo doia menos, exceto em subidas onde a dor era demais.

Meu amigo me acompanhava, mas eu o estava atrasando, pedi pra ir embora, faltavam dez quilômetros pro PC 200Km e eu chegaria lá nem que fosse empurrando, então ele foi. Sou muito agradecido a ele pela companhia nesses 20Km, fez muita diferença no meu ânimo.

Os últimos 2Km eram de subida, fui empurrando até a descida final. Uma ambulância do audax passou por mim. Fiz um sinal de OK e continuei empurrando. O carro do audax passou por mim e me ofereceu resgate, agradeci e disse que empurraria até o PC 200Km. Cheguei ao PC 200Km as 13.20, uma hora depois do meu previsto. Não estava de todo mal. Tinha mais de seis horas para cobrir 100Km, a maior parte descida. Seria mole se estivesse sem dores.

Klaus da organização me animou, disse que eu iria comer um macarrão quentinho, tomar um chocolate, fazer uma massagem, subir na bike e completar a prova. Não deu. A dor foi piorando e eu não conseguia mais dobrar a perna esquerda. Fiquei pensando em fazer a massagem, tomar algum analgésico e voltar a pedalar. Mas parecia que a lesão havia sido grande. Eu poderia terminar a prova e de quebra ganhar uma lesão maior e talvez permanente no joelho e não poder voltar a pedalar.

Milhares de pensamentos e considerações passaram pela minha cabeça. Foi difícil. Então meus amigos, com uma tristeza que eu tenho certeza, só quem abandona um Audax pode entender, eu decidi parar. Retirei as luvas. Retirei o capacete. Olhei pra minha bike que havia ralado tanto até aquele momento e me deu uma sensação de solidão e desamparo tão grande que eu quase chorei.

Tão perto e tão longe.

Fiquei ali sentado vendo outros ciclistas chegarem e partirem rumo a reta de chegada, cansados mas determinados. Desejei de coração que todos completassem. Fiquei imaginando a felicidade de cada um quando aquela pequena medalinha estivesse em seus pescoços...Infelizmente essa história, a do pedal Audax 300Km acaba aqui, no quilômetro 200, gostaria de poder contá-la até o final, mas isso ficará para uma outra oportunidade.

Vale dizer que eu vou voltar para Porto Alegre, e vou tentar o Audax quantas vezes for necessário até completar a série toda. A satisfação pessoal de conseguir esse feito é impagável e não vou desistir enquanto não sentir essa satisfação completamente.

Para todos aqueles Audaxiosos que estiveram naquele frio, naquela chuva e escuridão, completando ou não o trecho, eu quero dizer que foi um grande prazer poder estar com vocês, gaúchos, paranaenses, paulistas, foram momentos mágicos de pedal.

Ao pessoal do Audax o meu muito obrigado por nos proporcionarem um eventoassim, sei que não é fácil, que exige dedicação, abnegação e coragem. Não me senti em momento algum desamparado pela organização. Nos PCs que eu parei e nos carros de apoio com os quais cruzei, eu pude receber sorrisos e palavras de incentivo, um clima afetuoso e de irmandade. Espero poder estar com vocês aí participando do apoio no Audax 400Km. Gostei muito de todos vocês.

Abraços, Ricardo "Curupas" Rebas do Cerrado/Pedal Noturno DF

segunda-feira, maio 08, 2006

Superando Limites III

Bem, eu havia me decidido a não escrever mais essas crônicas...muita gente não gosta, eu entre eles há há há...mas eu não resisti e lá vai mais uma leva de bobagens pra vocês, minha visão mais do que bastante pessoal do SL III.

Eu sugiro que não leiam, apaguem e preservem suas almas e seu precioso tempo :o)

Para aqueles que mesmo avisados resolverem ler...favor não reclamar depois...

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Os viciados, os descontrolados, os malucos, os sem noção, todos aqueles que oscilam entre duas tentações, são provavelmente como eu.

Caramba. Onde tem uma bicicleta lá estou eu...Curupas...você precisa se controlar, tem outras coisas por aí, um barzinho, um camping...dormir!! Entre outras atividades muito boas, inenarráveis nesse horário e nesse canal.

Certo! Não vou ao superando limites, minha camisa é meio velhinha, já conheço o trecho, o horário de largada é uma coisa de psicopata e tá muito caro...vou passear no parque.

Tenho dito.

Claro que eu precisava de apoio emocional pra fazer isso. Não é fácil não. Contava (como sempre) com os meus amigos, os bródi. Eles não iriam também. Ninguém vai. Pronto. Chega desse negócio de superar limites. Tenho mais o que fazer.

Ahhh...Aí eu soube que a minha brother Tatiana iria pro SL III, isso mancomunada com uma galera de pretensos amigos (uma lista grande de traidores que eu não vou me dignar a reproduzir aqui).

Mas eu resistiria bravamente. Não iria sucumbir. Era preciso, excesso de bike. Resistir...resistir...

Não pedalar. Trilha feia. Poeira chata. Matinho fedido. Não vou, não vou....

Dia 03/05. 14:00hs. Voltei do almoço, abri meu email e foi como um golpe baixo em uma luta de boxe. Um cara completamente sem coração estava liquidando uma inscrição pro SL III quase pela metade do preço. Diabólico mesmo. Eu não teria sido tão baixo.

Fui praticamente obrigado a comprar aquela inscrição. Ainda liguei pro Marcus (ele mesmo, o sem vergonha), esperançoso, torcendo pra ele já ter vendido a inscrição. Que nada. Ele me disse "na verdade não"...

E assim...

22:30 do dia 06/05. O inferno mais uma vez. Um ano depois minha vida repete-se...

Após ter arrumado, desarrumado e re-arrumado umas 658 vezes minha mochila e a bike, finalmente me deitei pra dormir.

Enrolado nos lençóis, no escuro...dorme...dorme...dorme

Nada. Ouço o suspiro do meu cachorrinho Dart (um Golden Retriever mais que carente). Ele está cutucando a porta do meu quarto com a pata.

O sono não vem. Os ruídos parecem avolumar-se. Pingos no banheiro. A vizinha resmungando no andar de baixo. Alguém sacudindo as chaves no estacionamento.

Dorme desgraçado!!

Nada...

Meia noite eu levantei. Arrumei mais umas dez vezes minha mochila e fui pro carro em direção ao ponto de encontro no VIP Park.

Eita! Eu iria cair da bike, de tanto sono.

Engraçado, aqui vai um contra-ponto com o SL II (ano passado). Cheguei no estacionamento das vans e achei todo mundo tão quieto. Tinha um pessoal mais bagunceiro no SL II...devem ter sido presos, pensei. Percebi nessa hora que alguns dos piores elementos do mountain bike não iriam pedalar o SL III, por isso a tranqüilidade.

Fiquei com medo...há há há há...em quem eu colocaria a culpa de alguma possível bagunça que, sem querer, eu fizesse?

Resolvi me comportar. Tava meio chateado porque agora que eu estava nessa roubada de ficar a noite toda acordado e depois ainda ter que pedalar no meio do mato mais algumas horas comendo banana e poeira, também, minha namoradinha, queridinha, cheirosa, macia, sorridente, calorosa, elétrica, engraçada, inteligente, etc.. (ahh média boa que eu fiz agora)....não veio :o(, eu estava prestes a ser o mountain biker mais carente, sozinho e desconsolado do SL III, ai ai...

É claro que eu fui com o meu breteli rosa-macho. Por que andar que nem um urubuzinho em cima da bike, onde está escrito isso? :oPPP. Engraçado como essa cor parece mexer com as mentes de alguns mountain bikers. Um psicólogo iria ganhar uma grana forte no meio. O próximo breteli vai ser laranja, ha ha ha...

Acho que é uma reação de tribo. Tem a tribo dos que usam camelbak e a dos q não usam. A tribo dos que arrancam na frente e a dos que vão atrás, a tribo da SRAM e a tribo Shimano. Dos Tioga e dos Maxxis, a tribo dos que dividem o mundo em preto-branco e a tribo dos que acreditam que existam mais nuances, etc.

E tem a minha tribo. A tribo que acha isso tudo engraçado.

E sem a menor importância.

O importante é pedalar.

E foi dada a largada.

Na semana anterior participei dos 70Km de Ceilândia gripado. Meu batimento na hora da largada era 132. Quase morri por lá.

Ainda estava um pouco gripado, mas estava me sentindo bem melhor. Meu batimento na largada do SL III foi 74, seis acima do meu batimento de repouso usual. Iríamos ver, mas não iria me matar. Nem iria querer por pra fora minhas vísceras como quase cheguei a fazer na Ceilândia.

Eu havia me proposto a acompanhar algumas amigas durante o pedal pra Pirinópolis, na boa, conversando e aproveitando o pedal, por causa disso eu esperei passar a quase totalidade da galera de forma a poder procurar as camaradas, mas não vi nenhuma delas então eu subi na bike e tentei alcançar o primeiro pelotão que já havia se distanciado de mim quase um quilômetro quando eu larguei.

O primeiro pelotão de largada era composto por cerca de 20 bikers, eu os perdi de vista na entrada do PC1 (saindo do asfalto). Sem problemas, eu iria tentar manter a média geral entre 18 e 20Km/h que havia me proposto no começo do pedal com três paradas de cinco minutos nos PAs. Isso me colocaria em Corumbá as 10:52-11:16, 3:52-4:16 horas de pedal. Como eu disse, não iria me matar pedalando.

Considerando a quantidade de apoio disponibilizada ao longo do percurso e o clima, levei apenas uma garrafa de 750ml contendo hydroplus que eu recompletaria a cada PA (quatro sachês de hydroplus). Em cada PA eu também beberia 300-400 ml de água pura e comeria uma tangerina e uma banana. Levei 5 power-gel, 3 para a primeira parte do pedal. Essa estratégia se mostrou funcional mesmo considerando o fato de que eu não vi o PA1 (mas havia uma espécie de PA adicional alguns quilômetros para a frente).

Devido a estratégia de manter uma velocidade média (baixa) o melhor possível eu acabei pedalando a maior parte do tempo sozinho prensado entre dois pelotões que flutuavam seus bikers ao redor de mim.

Vou contar algumas coisas pra vocês de como é pedalar sozinho, na cozinha, no meio ou no primeiro pelote. Talvez vocês se espantem com as minhas conclusões.

Ali, atravessando aqueles corredores, espécie de túneis entre uma realidade e outra, entre o que você é o que você deseja em cada momento e mediado pela realidade que te é imposta e nem sempre acontecendo do jeito que você imaginava, é onde acontece a verdadeira superação do seu limite, mental e emocional, a batalha mais dura entre todas...você versus você...e não é tão fácil ganhar de você mesmo...

(continua depois :oP)

segunda-feira, novembro 28, 2005

Feliz Natal!!!

PS: É meio grande...e meio sem nexo, eu sei...estou tentando me controlar, mas não consigo, o terapeuta está quase desistindo de mim :o( mas para facilitar eu informo que o "Feliz Natal" está lá no finalzinho do texto, podem pular o "começo" se quiserem :o)

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Quando eu era criança, tinha uns onze anos, eu comecei a me interessar por questões místicas, crenças, essas coisas. Na minha família sempre foi postura de minha mãe e meu pai um relacionamento meio largado com a religiosidade. Cada um seguia um rumo próprio.

Eu, desde que aprendi a ler, sempre adorei os livros, devorava (e devoro) tudo que me caía nas mãos.

Li a Bíblia, não entendi nada, li umas três vezes, gostei daquele negócio do céu e tal. Bacana. Quem sabe não passaria Sítio do Pica-Pau Amarelo toda hora e eu tivesse um estoque ilimitado daqueles caramelos que eu gostava tanto. Bom demais.

Bem, pra chegar lá a pessoa não podia ser pecadora senão iria imediatamente pro inferno. Na minha cabeça pra eu ir pro céu eu não podia ter muitos pecados.

Eu acreditava que as pessoas devem ter alguns créditos de pecados que poderiam ser cometidos ao longo de sua existência e se o saldo fosse bom o céu estaria no papo.

Pensei, pensei, e cheguei a conclusão que eu cometia entre quatro a sete pecados por dia. Por exemplo: não comer os matinhos que vinha no prato, jogar fora pão, não deixar sobremesa pros meus irmãos, puxar o cabelo da minha irmã, ficar jogando bola o dia todo e não tomar banho
direito...essas coisas.

Considerando que eu iria viver até ficar bem velhinho, uns trinta e cinco anos, seriam cerca de noventa mil pecados no total.

Fiquei feliz. Achei que cem mil pecados era o limite, um número bonito. E eu ainda tinha um crédito de dez mil pecados para usar aqui e ali em emergências. Era um bom garoto mesmo.

Por desencargo de consciência fui checar minhas contas com minha mãe. Aí ela me arrasou, disse que bastava um único pecado para eu ir para o inferno.

Nossa! Eu já havia cometido uns 28 mil!

Já era.

Mas minha mãe explicou que Deus era bondoso e que se eu me arrependesse dos meus pecados todos eles seriam perdoados e eu iria ganhar meu lugar no céu.

Naquela época falhei em compreender o sentido da palavra "arrependimento" em toda a sua extensão e profundidade.

Espertamente imaginei que poderia manter minha conduta pecadora e no final de minha vida arrepender-me de tudo, burlar Deus e ganhar meu lugarzinho especial pra assistir TV por toda a eternidade.

Confesso! Apoiado nesse raciocínio levei uma vida "criminosa" e pecadora por muitos anos. Cresci praticamente sem comer quase nenhum matinho, torturei as bonecas de minha irmã com "neurocirurgias" inenarráveis e só recentemente aprendi a tomar banho corretamente.

Mas os anos passam. Você amadurece e a luz dessa experiência você passa a modificar velhos pensamentos outrora muito arraigados, as vezes lentamente, as vezes mais rapidamente.

Muitos anos depois estou eu aqui relembrando isso e pensando em como a vida ela própria é carregada de mistérios e como nós temos que viver essa vida da melhor maneira possível, sendo feliz sem magoar ninguém e cometendo o menor número de "pecados" humanamente possível.

Não é fácil não, mesmo para a alma mais bem intencionada.

Viver é quase como um jogo de dados coletivo, quando as peças rolam a sorte está lançada. Você pode se esforçar, sacudir a mesa, tentar virar um dado mas as vezes aquele resultado parece que já estava predestinado.

Você é senhor do seu destino? As vezes sim, as vezes não.

E você continua vivendo e torcendo para que no final tu dê certo, igual aquele garoto de onze anos que não queria perder nunca um episódio do Sítio do Pica-Pau Amarelo. Porém, nem tudo é como a gente sonha.

Dia 26/12/2004, uma data curiosamente próxima ao Natal, eu passei a conhecer pessoas que para sempre irão fazer parte da minha vida e eu sou muito grato por esse acontecimento. Algumas dessas pessoas me conhecem um pouco mais, outras um pouco menos. Nesse meio tempo fortaleci alguns laços de amizade enquanto outros foram quebrados.

É a vida seguindo seu caminho. Parece que está dando certo, apesar dos atropelos :o)

Eu quero aproveitar e dizer para todos vocês, independente do que pensam de mim, de me conhecerem ou não, membros do Rebas do Cerrado, do Mountain Bike Brasilia, do Pedal Noturno DF, das inúmeras pessoas gente boa espalhadas em todos os cantos do DF e que como eu, amam o mountain bike, a natureza, a beleza e a paz de espírito, eu quero dizer que vocês todos são meus irmãos de alma, e que meu presente de Natal do ano passado, desse ano e certamente de todos os anos futuros de minha vida é estar ao lado de vocês, de preferência em cima de uma mountain bike, em qualquer pelotão.

Viver é um filme que só passa uma vez. Sem roteiro, sem remakes. Vamos aproveitá-la o melhor possível e vamos dar um voto de confiança aos nossos semelhantes, as vezes as coisas não podiam ter acontecido de outra maneira, para ambas as partes.

Feliz Natal para todos! Tudo de bom, muito paz no coração e todos os sonhos que quiserem.

Ricardo "Curupas"

sexta-feira, outubro 14, 2005

Um Dia no Alto Delírio com a Elite do Mountain Bike

Eu e minha boca grande, não é?

Falei que o pedal no Alto Delírio não era para novatos mas que a elite poderia ir se quisesse, passear.

Cara, esse pessoal da elite não é só ralação não. Não é que apareceram alguns lá "para passear" pois haviam treinado ou competido no dia anterior.

Pois é, ocorre que nesse nosso mundo einsteniano, relatívistico, o que é passeio para uns pode ser tornar algo bem mais formidável para outros. Acabou que eu fui o único novato por aquelas bandas naquele dia ka ka ka ka...

Até então só havia feito o Delírio pela metade, a primeira vez eu fiz até o início do single durante a liberação das cinzas de Bob e depois até um pouco antes do empurra bike durante o GP de Montanha.

Em ambas as oportunidades não deu para compreender porque o Alto Delírio é uma trilha tão adorada pelos mountain bikers.

Dessa vez foi diferente.

Não sei o que passa na cabeça de cada um quando monta em sua bike e avança sobre trilhas, dificeis ou não.

Talvez para alguns tudo se resuma em quilometragem concluída e restante: já pedalei tanto e só falta um outro tanto para concluir.

Para outros talvez seja: eu consegui fazer essa parte e aquela outra quase consegui...sei lá.

Eu viajo nas trilhas, eu respiro e vivo cada momento.

Quando eu passo nas pedrinhas, no cascalho ao longo de um trecho, eu vejo a marca dos pneus, as depressões deixadas por alguém antes de mim.

As vezes eu tento me colocar no lugar daquele biker e tento fazer o que imagino que ele faria.

Nos descidões, aqueles que você para a bike um pouco antes para avaliar o quanto você vai se machucar se não der certo, quase posso ver um biker fazendo o descidão, como uma imagem fantasma, como uma projeção, descendo a trilha e saltando cada pedra, controlando a bike até o final da pirambeira.

Quando isso acontece, eu respiro fundo e tento seguir o biker, repetindo cada manobra.

Normalmente chego ao final inteiro, mas nem sempre.

Quando não consigo essa imagem então eu desço da bike. É como se fosseum aviso dizendo: não vai dar, cara. Talvez seja meu anjo da guarda, talvez eu seja louco ou muito imaginativo, talvez a sede e a fome alterem minha cabeça, cozinhe meus miolos, não sei e não me preocupo em descobrir.

Ao longo da trilha eu olho a paisagem, vejo os pássaros, as montanhas ao redor. E eu acho tudo tão bonito que parece que estou em um filme.Tenho uma sensação de paz indescritível enquanto estou na bike. Não importa a sede, o cansaço ou a fome.

É sempre muito bom.

E tem aquelas trilhas que parecem uma música, elas fluem ao longo de cada pedalada, um evento ligado ao outro.

Algumas trilhas não tem essa música e por isso eu não gosto delas, de algumas outras trilhas eu não gosto da música.

Mas existem trillhas que parecem um concerto, uma ópera rock.

O Alto Delírio foi assim nesse quarta-feira. Um Black Sabbath a todo volume. Alguns momentos de Pink Floyd e Vivaldi. Cada trecho uma emoção.

Meu anjo da guarda de olhos verdes e fala mansa as vezes a minha frente, as vezes na retaguarda, me mostrava o caminho e me explicava como fazer. Mas dessa vez esse anjo não estava na minha cabeça, era de carne, osso, alegria e paciência.

Ao seu lado, flanqueando a trilha, subindo morros e por vezes simplesmente parados aguardando minha chegada, outros bikers coloriam o lugar.

E de cada um deles aprendi alguma coisa. E tentei fazer igual.

Subi cada um daqueles morros pedalando. Nunca passou pela minha cabeça que conseguiria.

A gente consegue fazer muita coisa sozinho, não é mesmo? Mas cercadode amigos é mil vezes mais fácil. E mais divertido.

Durante o single tomei dois tombos. Fiquei meio raladinho mas não está doendo muito. Aquele single é muito louco.

Os morros ao redor gritam para serem admirados, eu não conseguia pedalar olhando somente o caminho. Os morros queriam falar comigo e assim, distraÍdo, respirando a natureza, fui caindo por lá.

Cheguei ao empurra bike e atravessei aquele belo single no meio domato. Parecia que tinha sido teleportado para outro lugar, a paisagem mudou quase instantaneamente, os morros ficaram invisíveis. Ao final dele meu anjo me pediu cuidado e eu, que já ia me arremessar morro abaixo naquela primeira descida técnica empurrei o primeiro trecho.

Foi melhor assim.

Depois eu vi o descidão pedreira, meus amigos elite desciam montados na bike, Eu só pude assistir.

Um dia eu volto lá pra descer em cima de minha bike também. Um dia eu quero fazer o Delírio todo pedalando.

As vezes me distraio tanto nas trilhas que simplesmente me perco do pessoal, aconteceu umas tantas vezes no Delírio e como eu não conhecia o caminho a galera tinha que me esperar um tempão até eu me localizar.

Desculpem :D.

E o famoso riozinho na fazenda? Tantas vezes falado. Aproveitei para lavar os raladinhos e esfriar a cabeça.

Aquele bando de adultos lá dentro parecia um monte de garotinhos e garotinhas, só faltavam as bóias de braço e os patinhos de borracha. Sentado ali naquele rio conversando pequenas coisas, despreocupado, eu voltei muitos anos no tempo.

Mountain bike parece criar esses túneis do tempo, você chega cansado do trabalho, cheio de preocupações, de deveres, então você sobe na sua magrela e o mundo imediatamente ganha cor, substância e juventude. Dependendo do lugar e com quem você está parece que a qualquer momento você vai ouvir sua vó lhe pedindo pra largar a bola e ir almoçar...e aí você grita "já vou, vovó!!" e some antes que ela venha lhe pegar pela orelha.

Ao pegar o estradão de volta, minha pilha começou a acabar e fui obrigado a me separar do pelotão, fiquei com meu bródi Ovinho que quebrou. Ele estava sem pedalar e retomou ao pedal fazendo o AltoDelírio, he he, adoro estar cercado de malucos, me sinto em casa!

Consegui chegar ao Caldeirão da Serra pedalando (55.71 Km). Ufa! Mas se não conseguisse não seria problema, meu anjinho já havia iniciado o resgate de carro e passou por mim para recolher Ovinho primeiro. Os outros aguardavam pacientemente eu chegar, felizes e despreocupados.

Quem diria...a elite aguardando a chegada de alguém como eu. A elite no resgate. A elite entre os mortais.

Acreditava ser isso uma impossibilidade, como parar o sol ou escapar da morte.

Muitos mitos caíram naquela quarta-feira.

Após esse pedal no Alto Delírio com a elite, minha vida sobre uma mountain bike ganhou outra perspectiva.

Eu também posso! Se me esforçar o suficiente. Se persistir. Treinar.

Meus amigos elite me mostraram isso.

Sem perder a humanidade, sem deixar os amigos pra trás.

Abraços,

Ricardo "Curupas"

domingo, outubro 09, 2005

Depoimento Iron Biker 2005 - A história por trás da crônica

É uma espécie de desabafo.

Recebi 23 emails em PVT comentando aquele meu depoimento sobre o Iron Biker. Desses 23 emails, 5 estavam curiosos em saber quem era o "amor" que me emocionou tanto, ou se era uma historinha só pra compor um texto.

Bem, tudo o que escrevo nunca é de todo dissociado da realidade. Ela pode estar muito pouco representada lá, mas sempre terá seu quinhão garantido.

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Muitos anos atrás, 1984 para ser exato, eu conheci uma garota, AldaMaria "Aldinha", eu tinha 20 anos naquela época e era mais um garoto magricelo, encardido, poeta, músico e trotskita :o). Achava que o mundo deveria ser transformado, etc. etc.

Eu era louco por essa menina, ela, é claro, era louca por outro rapaz (já ouviram essa história antes?).

Eu frequentava um minúsculo barzinho de universitários em Belém, o 3x4, tinha uma amiga, Tatiana, que era linda e me adorava mas que namorava um grande amigo meu...difícil, né? :o)
Eu, Tatiana, Fernandão, Kalico e mais alguns flutuantes costumávamos sair do 3x4 e irmos para a casa de Fernandão ouvir Janis e bebericar néctar de pêssego (eu adorava, era muito pobre e não tinha essas coisas em casa).

Quando o nome Aldinha vinha a baila não tinha como eu segurar as lágrimas. E se estivesse rolando Summertime, cara, eu ficava muitodeprê.

Meus amigos faziam campanhas pró-ricardo direto. Aldinha não estava nem aí.Chance ZERO.
Outras meninas tentavam vir me consolar e tal, me paparicar, mas não adiantava nada, elas não eram Aldinha.

A gente vivia acampando pelas ilhas (mais de trezentas) e sítios que circundam a região.
Um dia resolvi acampar no sítio do meu tio, interior do Pará, em meio a floresta amazônica, com onças, porcos-do-mato, capivara, pacas,veados, toda essa galera.

Os amigos (camaradas, naquela época) piraram! Resultado: uns quinze resolveram ir comigo.Quem diria: Aldinha, que era louca por camping e trekking, quis ir. Foi sozinha. Era um daqueles casos de que a garota gosta do cara mas o cara não liga muito pra garota que tem.

Ela foi meio tristinha para o camping. Quem consegue ir para qualquer lugar deixando uma metade sua para trás?

O sítio de meu tio era lindo e rude. Uma casa central muito grande, de madeira. O teto avançava alguns metros para a frente criando uma espécie de área coberta sem paredes. Lá atávamos redes para dormir e descansar, etc.

A casa era suspensa pois o rio próximo avançava até lá no "inverno amazônico". Nota: o Pará tem duas estações ao longo do ano: o de chuvas e o de mais chuvas ainda. Quente.

O café da manhã a gente tinha que colher, torrar e moer. Tomamos café só no primeiro dia. :o)

A noite, próximos as chamas de um fogão a lenha, comendo beiju e peixe frito, e com a ajuda de um lampião a querosene, ouvíamos histórias das lendas paraenses que meu tio e tia adoravam contar: saci, mula-sem-cabeça, e sobre o Curupira, meu nickname.

De como ele escapou do Curupira mais de uma vez, e tantos outros"causos". Íamos para nossas redes e esteiras felizes e de estômago cheio.

Os casais se aconchegavam e ficavam assim, arrulhando, horas a fio, noite a dentro.

Eu ficava absorto no lado de fora olhando o céu. Adoro olhar as estrelas, isso desde criança, ahhh se eu pudesse tocá-las!!

Aldinha também não dormia fácil. Chegava de mansinho, as vezes com uma caneca cheia de chá. Sorria pra mim...era tão bonito o sorriso dela que eu esquecia as estrelas no céu, o chão sob meus pés e que ela amava outra pessoa.

Eu sorria também.

Ela deitava ao meu lado dividindo a mesma esteira e ficávamos ali, juntinhos, em silêncio, por muito tempo.

Estrelas cadentes riscavam o céu...ela segurava minha mão e pedia para eu fazer um desejo. Desejei que ela gostasse de mim para cada estrela cadente que passou e fiz assim todas as noites em que ficamos lá.

Ainda hoje, quando eu vejo uma estrela cadente eu lembro dela. Sempre.

Conversávamos muito. Tínhamos muitas afinidades e muitas diferenças. Nossos gostos musicais não eram exatamente os mesmos...ela gostava de Spyro Gyro e Beto Guedes...Ela era, no meu jargão de época, uma alienada pequeno-burguesa :o) ...bem, as diferenças são um tempero, não são? Ou o amor suaviza as diferenças...

Foram momentos felizes! De dia pegávamos canoas indígenas e íamos pescar e nadar, seguíamos trilhas de onças, por pura maluquice. Quando ouvíamos os rugidos saíamos correndo. Loucos!

Uma vez pegamos um jacaré. Quase come um dedo do meu pé. Na panela ele ficou bem melhor.

Um dia isso acabou. Meus amigos iriam voltar pra casa. Aldinha com eles. Resolvi ficar. Foi um dia triste aquele. Era como tudo que eu olhasse ou fizesse fosse cinza, sem sal, sem cheiro.

Congelado o universo em uma ausência completa dele mesmo.

Dois dias depois um garoto traz um recado dizendo que Aldinha iria chegar no dia seguinte para passar mais uma semana no sítio de meu avô.

Sou meio retardado, mais ainda com mulheres. Achei que viriam ela e o namorado, ou com alguns de meus amigos, ou que se viesse sozinha, para ficar na dela. Nada disso era uma impossibilidade.

Fui buscá-la na hora combinada, na estrada. Andei nove quilometros em um estradão (nem sabia o que era MTB na época) em meio a uma das maiores chuvas da minha vida.

Encontrei Aldinha na casa de um amigo de meu tio a beira da estrada, havia se molhado e foi acolhida lá, onde se trocou e tomou uma bebida quente. Ela me olhou, sorriu (aquele sorriso novamente!), me abraçou, me beijou demoradamente uma de minhas bochechas. Achei que iria incendiar.

Peguei as coisas dela, a mochila, e carreguei de volta os oito quilômetros.

Durante a nossa conversa de volta ela explicou que resolveu voltar porque tinha se sentido muito feliz no sítio de meu tio e queria um pouco mais dessa felicidade antes de voltar para as aulas do segundo semestre. As coisas não estavam muito animadas lá em Belém, ela me confessou.

No meio do caminho ela segurou minha mão e desse jeito chegamos no meu tio.
Como bons amigos, andávamos abraçados, de mãos dadas, conversando e rindo até a hora de dormir.

Atamos nossas redes uma bem ao lado da outra. Conversamos até ela simplesmente desmaiar de sono.

No dia seguinte, acordei e caminhei, feliz da vida, por entre o pomar do meu tio próximo ao riacho.

Que mundo belo e fantástico estava logo ali, ao alcance de minhas mãos. Um cheiro forte de jambo inundava o lugar. Os pássaros cantavam cantigas de amor.

O sol começava a nascer e iluminar todo o lugar, quando então me volto em direção a casa eu vejo Aldinha rumando em minha direção, aceno e sorrio pra ela, ela sorri de volta...eu arrepiei com aquele olhar.

O resto eu já contei. Está no depoimento do Iron Biker. A diferença é que foi um nascer de sol...
Aldinha e eu namoramos por quase um ano, inenarrável. FELIZ-PONTO. Uma vez, voltando pra casa, ela viu uma roseira no jardim de uma residência e me falou que era louca por rosas.

Pulei o muro e roubei uma rosa pro meu amor. E por muitos meses, todos os dias, pulava o muro daquela casa para roubar mais uma rosa, por ela.

Após nosso namoro eu fui morar em São Paulo. Aldinha, eu sabia, nunca esqueceu o cara que sempre lhe dava uma rosa antes do beijo de boa noite. E eu nunca esqueci Aldinha a garota que sempre me dava um sorriso antes de receber uma rosa.

Quando voltei para Belém a passeio, dois anos depois, Aldinha estava noiva. O noivo não quis que conversássemos mais e Aldinha, grávida desse rapaz, me mandou um recado por Tatiana de que teria que ser assim, porque não queria magoar seu futuro marido....a vida é feita de desencontros.

Aldinha casou quando eu já havia voltado para São Paulo.

Voltei mais uma vez pra Belém a passeio.

Cheguei no exato dia em que Aldinha havia falecido de complicações pós-parto. Recebi a notícia de um amigo a menos de uma quadra de onde o velório estava sendo realizado.

Aqui eu paro. Chega, não é?

Eu adorava aquela garota. Muito.

Muito.

Muito.

Ela é uma estrela cadente agora, um desejo fugaz.

Nunca mais dei rosas vermelhas para qualquer outra garota. Quando vejo uma estrela cadente no céu, ás vezes eu sinto que ela está comigo. E quando vejo uma estrela cadente no céu...o meu desejo passando...e sorrindo para mim. Saudades...

É isso aí.

Vamos pedalar.

Ricardo "Curupas"

quarta-feira, outubro 05, 2005

Depoimento Iron Biker 2005

Feche os olhos e imagine...

Você está sozinho, em meio a um bosque, um leve murmurar de águas denuncia um riacho próximo, no alto das árvores, passáros disputam cantos entre si.

Um sol avermelhado se põe por trás de uma pequena serra ao longe.

Você sorri. Está no paraíso.

Tomado de felicidade, você avista seu amor vindo em sua direção e sorri pra ele.

Seu amor percebe teu olhar e sorri de volta, em cumprimento.Teu corpo estremece sob o impacto daquele olhar.

O coração acelera.

Teu amor se aproxima. A cada passo dado tua ânsia por aquele contato iminente aumenta.

Teu amor toca tua mão.

Agora teu corpo é só emoção e desejo.

Vem o beijo.

Primeiro os lábios se tocam, as bocas misturam seus líquidos. Arrepio.

Um abraço.

E os corpos se unem.

Os dois são um só. Você explode.

Aquele momento poderia ser eterno.

Abra os olhos.

Ao seu redor centenas de mountain bikers montados em suas máquinas se alinham para a largada do Iron Biker 2005 na praça Tiradentes em OuroPreto. O tema de largada ecoa em seu cérebro cada vez mais forte: TUM! TUM!TUM!

Seu coração acompanha aquele ritmo. A fita de largada é liberada e você, de sua posição, observa a multidão, no mais completo silêncio, e na mais completa emoção, subir o primeiro morro, ainda na cidade, calçadas de pedra.

Por um breve instante você perde a noção de sua própria individualidade e sente-se parte de um todo, uma coisa maior que a soma de todos os ciclistas ali presentes.Você é todos que ali estão. Você é a elite, e é o pau-de-rato. O homem e a mulher. A criança e o velho.

Centenas de pernas e músculos. Uma única alma. Um único beijo.

Você arrepia completamente, seu coração ameaça sair pela boca, você engole em seco enquanto um frio desce medula abaixo.

Começa o pedal. Os morros, objeto de desafio e desejo, estão logo a sua frente, imponentes e passivos.

Eles serão seus, quer através das suas pernas, quer através de um semelhante.

Não importa.

Nosso pequeno exército de capacetes vencerá mais uma vez.

Por todos nós.

Assim eu pensei e comecei meu pedal no Iron Biker 2005. Aqueles primeiros minutos foram inesquecíveis e inebriantes. Não consigo lembrar nada durante os dois dias de prova que tenha me emocionado e marcado minha vida mais do que aqueles cem metros e dez minutos iniciais.

Minha maior recordação do Iron Biker foi aquele beijo em minha alma.

Da amante no amado.

De hoje em diante, por todo o resto de minha vida, vou querer repetir aqueles minutos de emoção.

Tive um vislumbre do amor que move um atleta. Foi maravilhoso. Quero morrer apaixonado assim.

Quem esteve lá acho que me entendeu.

Ricardo "Curupas"

quarta-feira, agosto 17, 2005

Feliz Aniversário Rebas do Cerrado!!!!

Há dois anos atrás, em um domingo tranquilo de sol, igual a tantos outros, um grupo de oito pessoas, unidos pela vontade de pedalar e conhecer as paisagens de nosso cerrado, com pouca habilidade técnica e condicionamento físico mas muito coração, camaradagem e vontade de se divertir, iniciou uma transformação no mountain bike que ainda não acabou.

Naqueles trechos fáceis do Baixo Delírio foi transformada em ação um desejo guardado e partilhado por muitas pessoas, o desejo de ser feliz, fazendo o que gosta ao lado de boa companhia, sem a necessidade de provar coisas alguma a quem quer que seja.

Simples.

A idéia transformada em prática foi tão genial e tão ansiosamente esperada, que aquele grupo de oito pessoas em poucas semanas se transformou em centenas de praticantes, iniciantes no mountain bike. Aquele grupo de oito pessoas foi como uma centelha em um gramado seco. E a fogueira não parou nunca mais de crescer.

Hoje somos quase mil membros, sem considerar aqueles que nos são simpatizantes e que vez ou outra nos acompanham em nossos pedais.

Somos um grupo bem diversificado, com mountain bikers de todas as linhagens e de todos os níveis técnicos, alguns são campeões enquanto outros ainda estão aprendendo a regular o selin de sua bike. Todos, sem exceção, irmãos de pedal e de alma, juntos até o final nas belas trilhas de nossa região.

Olhando para trás, olhando as antigas fotos onde Bob King, com o mesmo megafone que hoje temos orgulho de empunhar, fazia sua preleção dominical e iniciava mais uma trilha Rebas, eu penso com orgulho no peito que o Rebas do Cerrado continua seu legado.

Somos hoje seguramente o maior grupo de mountain bike do Brasil, somos também o grupo com a maior capacidade técnica e habilidade logística para execução de trilhas de mountain bike. Somos um grupo coeso, coerente e que influência positivamente os rumos do ciclismo em nossa região. Somos o grupo que tem a maior estrutura organizacional e que acumula uma quantidade de atividades similar, ou até maior, que outras organizações nesse esporte. Temos também a camisa mais bonita de todas!

Com custo zero para seus membros. Com trabalho voluntário e boa vontade.

Me orgulho de tudo isso.

Mas meu maior orgulho não é isso. Meu maior orgulho é que faço parte do grupo de mountain bike mais amistoso, charmoso, mais camarada, mais carregado de alma e sentimentos bons de todos os tempos. Um grupo onde só fiz amigos e onde só tive alegrias.

Mudou minha vida, e tenho certeza, a vida de muitos outros. Para melhor.

Eu te amo, Rebas do Cerrado.

E Bob King, lá em cima e conosco ao mesmo tempo, deve estar feliz com a obra que ele iniciou e que a nós coube continuar e preservar.

Feliz Aniversário Rebas do Cerrado!
Longa Vida ao Rebas do Cerrado!

Ricardo-Curupas

domingo, agosto 07, 2005

Morada da Serra

Quem me conhece um pouquinho sabe que eu me emociono fácil. Qualquer coisa eu choro, ou me arrepio. Ou então eu me alegro ou me enraiveço...não sou indiferente a nada, eu reajo a tudo o que acontece a meu redor, as vezes muito bem, as vezes muito mal...he he he.

Os meus amigos não podem reclamar que a minha companhia é monótona, quem quer sossego deve guardar uma distância segura de mim. Uns mil quilômetros acho bastante razoável :oP.

Putz, a trilha estava muito legal, não é? Cerca de setenta (70) bikers naquele lugar fantástico.

Comecei o pedal na cozinha e pude ver a cabeçada subindo os primeiros morros. Visão inesquecível! Eu acordei quatro horas da manhã com uma vontade louca de fazer essa trilha novamente.

Cada trecho que eu transpunha, num misto de assombro e orgulho, eu lembrava de algum fato ocorrido na última trilha. Na vez passada eu caí, logo no primeiro quilômetro, no barro molhado. O bar end acertou meu nariz e o sangue jorrou. Fiquei tonto e com vontade de vomitar.

Lembro de mim naquele dia, chorando totalmente frustrado, enquanto via os outros bikers ganhando distância. Talvez aquilo não fosse para mim, pensei.

Marcelino chegou em seu carro e me pediu para entrar, disse que era diversão, não sofrimento. Eu teria outras oportunidades para pedalar. Eu lembro nitidamente do olhar de Marcelino, preocupado, sinceramente preocupado comigo.

Mas eu também sou teimoso. Quem me conhece já deve saber disso. Peguei a bike e tentei pedalar mais um pouco. Não fui muito longe, vinte e dois quilos mais pesado que hoje e com pouco mais de um mês pedalando, não deu.

Teimosia tem limite. O mountain bike te ensina humildade, aos poucos, quer você queira ou não.

Subi no carro de apoio. Logo outros juntaram-se a mim. Pensei que o mountain bike era mais que um esporte, era um filosofia de superação pessoal, quase uma religião. Um dia eu voltaria ali e faria aquela trilha, não dentro do carro, mas em cima da minha bike. Não importa o quanto demorasse, eu voltaria ali.

Hoje cheguei pedalando no mirante, me aproximei da borda e olhei ao redor, indescritível meus sentimentos na hora.

Marcelino, queria que você estivesse por lá, queria poder te olhar nos olhos e dizer: Eu consegui! E te abraçar! Acho que você ficaria orgulhoso de mim. Na tua ausência eu preferi ficar só, assimilando o acontecimento. Fui para um cantinho e, para variar, chorei :o)

Não sou religioso, mas a perfeição do lugar faz a gente pensar, não é? Cada acontecimento tem seu tempo e lugar, não parece haver acaso, para o bem e para o mal. Senti falta de minha amiguinha Camilinha que eu conheci nessa trilha a primeira vez que foi feita, que pena que ela não pode vir. Só a presença dela ao redor já anima uma multidão. Mauro me disse que ela está gripada.

Cuide-se minha amiguinha. Adoro você! Queria muito ter acompanhado você na trilha hoje (pelo menos ter tentado :o) ).

Eu penso muito, muito mesmo. Gostaria tanto de conversar os meus pensamentos. Como isso não é possível ainda, então eu escrevo parte deles. Me desculpem :P

E eu percebi, lá no alto da Morada da Serra que eu sou louco por mountain bike, louquinho de pedra. O vírus me pegou. Estou irremediavelmente com a minha vida ligada a uma máquina com duas rodas e um banquinho.

Tomara que não exista cura! É bom demais pedalar. E algo mudou na minha percepção das coisas e das pessoas...mas isso é uma longa história, fica pra uma outra ocasião.

Naquele mirante eu queria estar abraçando minha parceira (que não tenho he he he). Certas emoções e certos sentimentos eles se tornam maiores e mais completos quando partilhados com quem você gosta. Espero que a proxima vez que eu faça a Morada da Serra eu consiga partilhar minhas emoções in loco, na hora em que elas acontecem, plenamente.

E minha parceira, o amor que um dia vou ter, também tem que amar o mountain bike.

O vento no rosto, o cheiro do mato. O canto dos pássaros.

Porque os que se amam devem partilhar mais que os corpos, mais que os pensamentos, devem partilhar suas ações, seu estilo de vida, de outra forma não é amor, é desejo.

O amor que um dia eu vou ter
pode ser qualquer uma,
pode ser branca, negra, alta ou baixa.

Pode gostar de música ou cinema,
de livros ou pintura.
Mas o amor que um dia vou ter também tem que amar o mountain bike.

Vamos juntos nas trilhas e nas descidas de mãos dadas, loucos até o final.
Nos mirantes, no ponto mais alto, abraçados escolhermos as montanhas do dia seguinte.

Uma vida inteira de trilhas.
Parceiros.
E em cada gole de água, também um beijo, um afago.

Montaremos nossas bikes e partiremos rumo ao por do sol,
e se amar a cada parada, até o último dia de nossas vidas.

O amor que um dia eu vou ter eu jamais vou esquecer.
Nem o mountain bike.

Ricardo-Curupas (meio viajando hoje)

segunda-feira, junho 13, 2005

Depoimento GP de Montanha (2005)

Caros,

Se a idéia do Weimar, era separar o joio do trigo, com requintes de sadismo e crueldade com pitadas de paisagem exuberante e tremendas lições de desafio e superação pessoal, ele conseguiu, ele está de parabéns!

A marcação da trilha, o tracklog os avisos, estavam ótimos!

Aquelas tangerinas no alto do carrega-bike eu saboreei umas três contemplando o Alto Delírio e pensando muito em como a vida é uma coisa bela, e como os momentos de felicidade podem vir mesmo nos mais difíceis momentos.

Muitos me perguntaram porque eu, com menos de seis meses pedalando me inscrevi na categoria Esporte (a dos 70Km) e não a Aventura (reduzida). Eu me inscrevi porque eu achava impossível completá-la, foi isso. Parece coisa de maluco? Pois é. Eu quis tentar, testar, não a superação, mas meu próprio limite. Eu acho que consegui.

Passei por trechos onde as marcas dos pneus mostravam alta velocidade, a beira de abismos, em cascalho, em subidas, em descidões. Vi marcas de galhos quebrados, sapatilhas, derrapagens. Eu, tentando seguir os grandes, aqueles bem mais experientes que eu. Aprendi muito nessa observação, nesse trabalho de tentar imaginar como fizeram os que muito tempo antes passarampor mim. Tenho muita admiração por todos, não foi fácil não.

Quando eu parei em frente ao empurra-bike (o primeiro) eu olhei ao redor e vi aquela paisagem calma, silenciosa, a não ser pelo canto de alguns pássaros esperando pelos seus desafiantes. Apenas ali, a espera. Nós, uma coisinha minúscula com seus maquininhas de alumínio e borracha. As montanhas pareciam dizer: Estamos a espera de vocês! Venham. Alcancem nosso ponto mais alto e nos admirem! Será a sua recompensa pelo esforço! Partilhar de nossa beleza!

Respirei fundo! Estava com fome (não levei comida, esqueci em casa, na pressa). Minhas costas e braços estavam doendo de uma queda na semana passada e estava ficando cansado após a subida de metade do Alto Delírio. Mas quer saber? Era um convite irrecusável. Eu ia ver o Delírio lá de cima!

Passei pelo último apoio, passei por alguns bikers que estavam fazendo o Delírio, atravessei quilômetros da mais completa solidão e atravessei séculos conversando comigo mesmo. Comecei aquela prova uma pessoa. Cheguei em Planaltina outra, completamente diferente.

O empurra-bike parecia crescer a cada pedalada, aquelas pequenas valas e cascalho solto, ridículas a distância, transformaram-se em grandes obstáculos. Comecei a subir, primeiro cerca de 5 metros por minuto, a parte final fiz a menos de dois metros por minuto. O empurra bike me pareceu um ralo de energia, quando eu terminei de subí-lo as primeiras câimbras começaram.

Nossa! Pedalar com câimbras dói, não é? Não sabia. E a cada subida que completava mais câimbras, em músculos diferentes, somaram-se as primeiras. Começou um congresso de câimbras, bem ali, nas minhas pernas, nas coxas. As vezes descia da bike e chorava, um minuto, dois. E voltava a pedalar.

Fui perdendo ritmo. Nas maiores subidas as câimbras vinham e eu tinha que empurrar. Logo logo, as câimbras vinham até nos planos, nos estradões. Era um questão de tempo até a parada total. A natureza ao meu redor, complacentemente esperando.

Finalmente, me aproximei do carrega-bike, quando eu o avistei, não pude deixar de rir! Aquilo estava errado. Olhei meu GPS e o mapa que carregava, as placas, as marcas dos pneus, tudo apontava para aquele paredão, não estava louco não! Quem estava louco era o Weimar!

Nesse momento, eu estava com tanta fome que me aproximei daquele paredão bem devagar, não tinha concentração suficiente para descer aqueles cascalhos sem cometer um deslize perigoso. Conversei pelo rádio com Spinner, que já estava quase completando a subida, da minha posição pude estimar que ele estava um quilômetro e meio na minha frente. Ele me informou que haviam consumido toda a água no alto do empurra-bike e só haviam restado as tangerinas. Pedi pra ele me deixar, se pudesse, dois power-gel. Esses dois power-gel, mais tarde, me deram algum fõlego. Valeu bródi Spinner!

O empurra-bike foi um tremendo teste psicológico. Achei que fosse parar por ali mesmo, a meio caminho do topo. Então eu pensava nas tangerinas, tangerinas suculentas e doces. Só mais um pouquinho pra eu pegar algumas.

Não conseguia carregar a bike por conta do estiramento nas costas, eu empurrava, prendia em algumas pedras e subia um pouquinho, achei mais fácil subir pelo mato porque minha sapatilha escorregava muito. Em um desses escorregões senti uma dor forte no tornozelo direito. Pensei: Agora só de helicóptero. Felizmente a dor passou uns dois minutos depois e eu pude continuar a escalada.

O empurra-bike é como se fosse um grande morro íngreme com um outro morrinho (ingreme também) em cima. De baixo você não vê esse pedacinho. Então eu fui subindo o pedaço maior, a distância diminuindo, a fome e a fraqueza aumentando, a esperança nas tangerinas bem forte.

Cheguei!

Quando pensei em me animar um pouco, olhei ao redor e vi o outro morrinho que faltava. Não dá pra explicar o desânimo que me deu. Tive que ficar parado um pouquinho, concentrando, respirando fundo.

Enfim, eu cheguei. Demorei exatos 27 minutos para completar a subida. Pareceram horas.

Tirei meu capacete, a bandana, as luvas, o camelbak, uma vontade danada de respirar fundo, ventilar, ficar pelado.

Olhei ao redor. De um lado as garrafas pelo chão, lixo. De outro a beleza fantástica do lugar. Peguei umas tangerinas e fiquei pensando....muitas coisas, nas pessoas que gosto, algumas delas nem percebem esse meu gostar :o), nas coisas que faço, nas coisas que fiz, as coisas que deixei de fazer. Principalmente pensei nas coisas que quero fazer. Cara, a cabeça é um negócio louco! Milhares de coisas se passaram, criei e destrui universos inteiros em minha mente, fiz e refiz dialógos. Olhei o relógio. Dez minutos haviam se passado. Hora de continuar.

Que gracinha aquele single logo na saída do empurra-bike. Um prêmio da natureza pelo nosso esforço, eu acredito.

Encontrei água gelada no carro de apoio logo depois. As duas últimas garrafinhas geladas meu bródi Spinner deixou pra mim. Nada paga uma amizade, não é? Camarada Spinner, eu me emocionei quando a moça do apoio falou: Olha eu tenho duas garrafinhas de água bem gelada que o seu amigo me pediu pra deixar pra você!

Calculando o tempo que eu demorei pra subir o empurra-bike, descanso, terreno, etc. Estimei em 6-8Km a distância de Spinner para mim. Pensei em forçar um pouco o ritmo para alcançá-lo.

Sem chance. Na primeira subida forte do Tobogã as câimbras quase me derrubaram da bike. O resto vocês podem imaginar. Dez quilômetros depois eu subi no carro de resgate. Não queria, não queria mesmo. Mas uma parte da luta é saber desistir no momento certo e esperar a próxima oportunidade, por isso, mesmo a contragosto, fiquei triste, tirei meu capacete, as luvas me separei da minha bike e subi no carro.

Fui bem chateado boa parte do caminho. Eu sabia que conseguiria completar...o problema era o tempo, estava indo muito lentamente.

Depois fui me conformando. Lá na frente recolhemos um bródi que estava gripado e cansou, mas uns quilômetrso recolhemos outro. Depois, faltando cerca de 10Km para a chegada cruzamos com Spinner, estava indo em um ritmo constante, devagar mas constante, parecia bem. Resolveu continuar. Bati palmas! Dei força, fiquei torcendo por ele! Completou! É isso mano véio!!

Quando cheguei na prefeitura, estava meio aéreo, Cláudia me pegou pelas mãos, me deu um beijinho e me levou onde estavam Janice, Othon e outros amigos.

Quando vi meus amigos eu confesso que fiquei bem alegre! Foi como se eu estivesse chegado em casa. Estava entre aqueles que gostavam de mim. Janicezinha parecia aliviada eu acho...o maluco do Curupa não quebrou o pescoço e fora a poeira no cabelo e na bike parece estar inteiro, não toma jeito mesmo...deve ter pensado. He he...

E agora? Será que tomei juízo e nas próximas competições vou estar nas provas light ou vou me meter entre a elite, feito um louco? Bem, eu acho que juízo, ou você tem, ou não tem. No meu caso, eu acho que eu não tenho mesmo! ha ha ha (riso insano), quem apostou na opção B (feito um louco) acertou!

Claro que não vou tentar nada onde possa estar expondo a vida de alguém a algum risco, direta ou indiretamente.

Para todos aqueles que fizeram a prova, completando ou não, meus sinceros parabéns, foi um momento mágico o dia de ontem.

Abraços!

Ricardo-Curupa

terça-feira, março 08, 2005

Feliz Dia Internacional das Mulheres. Para sempre. Todos os dias!

Nem sempre estar cercado é algo ruim, não é? Especialmente, estar cercado de garotas que praticam o mountain bike é muito bom!

Minha lista de brothers é quase completamente composta por essas garotas, que valentes ao seu modo, dividem as trilhas do DF conosco. Pra nós homens que crescemos jogando bola, corríamos em nossos velocípedes e ficávamos na rua o dia todo, ingressar para o mountain bike, pensando bem, não é algo tão radical assim, é até natural, consequência de nossas experiências anteriores.

E uma de nossas amigas pedalantes? Embora existam aquelas mais atletas que muitos garotos certamente para elas o mountain bike foi uma guinada em uma vida antes pacata.

Ao lado de seus brincos, um capacete, no guarda-roupa um conjunto de ciclismo divide espaço com o vestido de noite. Ao lado do computador, solene, espera a mountain bike sua próxima trilha. No chão, aqueles sapatos de bico fino e salto alto.

O que vai acontecer primeiro? A festa ou uma trilha?

Não importa, minha brother vai arrasar em qualquer um que escolher.

Legal, né?

Eu pedalo muito com minhas amigas, alguns de meus amigos sugerem que eu deva treinar mais vezes sozinho e andar menos com as meninas.

Tudo tem seu preço. Realmente, eu poderia estar pedalando mais e ter menos amigas.

A vida é feita de escolhas. Escolhi pedalar menos. De que me valeria o alto de um pódium se de quando lá descesse minha namorada não estivesse lá pra me beijar?

Algumas garotas que conheci deixaram em minha alma uma marca profunda, de coisas boas, verdadeiras e generosas.

Passaria aqui muitas horas escrevendo, rememorando e comentando tudo de bacana que aconteceu comigo com e graças as meninas de nosso mundo inteiro.

Não sei porque dizem que os homens dominam o mundo. No meu caso particular as meninas sempre me dominaram. E, se depender de mim, vai ser assim o resto de minha existência.

Quero deixar um beijo para todas e agradecer a algumas meninas passadas e presentes que marcaram minha vida:

Minha mamãe;
Letícia, Aldinha (saudades de você!! Descanse em paz), Marilice (antes eu era um moleque), Natasha e Lídia (filhas queridas), Ney/Renata/Paula/Lúcia/Sílvia (mais loucas que eu naquela casa no Ipiranga em sampa...se aquela casa falasse...), Glaucia, Lúcia (minha ex, foi muito parceira enquanto durou e uma pena ter acabado), Carolzinha e Camilinha (minhas prediletas no MTB!), Tatiana dos Anjos (brother), Bionda (brother, essa é BROTHER!!!!!), Karina (primeiro porre pelo amor não correspondido :oP, depois não valeu), Wilsea (naquelas épocas da biologia, eu era louco por vc, mas nos desencontramos, não foi?), Lúcia (professora de química na ETFPa, linda e sabida!! :o)), Vovó Mulata (gente boa), Paula (minha prima, que me criou e suportou meu temperamento péssimo de pirralho, saudades de vc, descanse em paz), Ana (minha primeira namoradinha, meu primeiro beijo e ainda fugindo da polícia, com direito a gás lacrimogênio em meio as lutas anti-ditadura militar, as mãos suadas, o corpo trêmulo...), Mara (quase hein?), Daniela (foi namoro aquelas duas horas?), Ana Paula, Ritinha, Aline, Lica (você era linda, de deixar qualquer um louco, e aquelas fotos de "nú artistico", que fim levaram?), Danielle (brother), Aline (brother), Tatiane (De borest brother ;o) ), Amandinha (minha amiguinha que adora poesia), Angelina (vc foi uma garota legal!), Tatiana (a gente merecia ter sido namorados, não?) , Marcinha (um dia a gente corre juntos), Diana (minha amiguinha bióloga, saudades da biologia :o( )....puxa..nao vou conseguir listar todas as meninas que marcaram/marcam minha vida...

A gente conhece muita gente por aí...mas eu não vou esquecer, pra terminar essas divagações, de deixar um grande beijo pra Priscila minha namorada mountain biker :o) e que nessas últimas semanas tem sido minha companhia constante pra quase tudo quanto é lugar que eu vou.

Priscila, minha brodi e parceira de tantas coisas, você está sendo muito dez comigo! Muito bom ter te conhecido.

Mulheres vocês já dominam o mundo, de um modo bonito e sem alardes. Merecidamente. Reinado eterno pra vocês!

Curupas,